A subida da Brigadeiro Luiz Antônio está difícil, deve estar uns 32 graus e seu esforço é grande para manter aqueles módicos 6 pra 1 – afinal você treinou pra isso. Para se distrair, você observa aquela platéia divertidíssima que só habita a terra em dia de São Silvestre e depois nunca mais ninguém vê, disfarçam-se por trás dos uniformes, balcões e volantes da gigantesca paulicéia. Lá pelo meio da subida, encosta do seu lado um risonho velhinho que te cumprimenta e vai embora!?! Isso mesmo! Ele deve ter pelo menos uns 40 anos a mais que você e corre, tranquilamente, uns 30% mais rápido. Logo ele some. Você administra o ritmo cardíaco, que obviamente subiu um pouco na tentativa de acompanhar o velhinho. Passo a passo você vai vencendo a íngreme e longa subida, já pensando no lombinho e no champanhe da ceia de reveillon, quando de repente... Outro velhinho, mais velhinho que o primeiro velhinho, também te ultrapassa e some!?!?! Até o final da corrida seriam quatro velhinhos que te fariam se sentir, literalmente, ultrapassado!!! Final da Brigadeiro, final da corrida, final de ano!!! Festa reveillon, cueca branca, champanhe, uvas e fogos!!! Mas na ceia ao olhar pra seu avô descendo a escada com ajuda dos netos, vem a sua mente a imagem dos velhinhos sumindo Brigadeiro acima. Ao comentar com um cunhado de sua tia sobre o ocorrido ele te conta uma coisa surpreendente.
Disse ele:
- Você não sabia que em todas as provas de corrida de rua velhinhos são contratados para correr algum trecho difícil da prova?
- Não! Digo atônito
- Por que? Pergunto já curioso
- É sim , o objetivo é motivar as pessoas a correrem mais.
- O quê!? Respondo já sentindo uma fisgada na coxa esquerda, resultado da tentativa de encostar no velhinho número três.
- É isso mesmo, eles são levados de Kombi até o local e saem em disparada, correm no máximo uns 1.500 metros e voltam pra Kombi.
- São contratados as dezenas! A cada trecho tem uns dois, na São Silvestre só na Brigadeiro devia ter uns 40.
- Mas nunca ouvi ninguém falar disso? Respondo
- Nem vai ouvir!
- Por que não? Pergunto
- Porque jamais algum garotão de meia idade como você admitiria ter sido ultrapassado por um velhinho! Assim nunca ninguém fica sabendo, pois eles não existem sacou?
- Mas eu admiti! Digo resignado
- É o primeiro que vejo em 30 anos!
- E como você sabe disso tudo? Pergunto atônito.
- Eu alugo as Kombis!
- Me dá mais um champagne! Gritei
- Vamos brindar aos velhinhos corredores!
Mais tarde já na cama você tem um daqueles momentos de reflexão típicos de ano novo:
- Pensando bem acho que naquele ritmo nem 1.500 metros eu conseguiria correr.
- Ano que vem vou treinar mais e quero ver algum velhinho me alcançar!
- Eles conseguiram me motivar! Penso
- Me espreguiço para dormir e ops! Quase tenho uma câimbra na panturrilha esquerda...
- Bom, é melhor eu ir dormir amanhã será outro ano...
Andre Fehlauer